[[{"fid":"3992","view_mode":"teaser","fields":{"format":"teaser","field_file_image_alt_text[und][0][value]":false,"field_file_image_title_text[und][0][value]":false},"link_text":null,"type":"media","field_deltas":{"2":{"format":"teaser","field_file_image_alt_text[und][0][value]":false,"field_file_image_title_text[und][0][value]":false}},"attributes":{"class":"media-element file-teaser","data-delta":"2"}}]]Há muito muito tempo, quando eu ainda era criança e a abundância não era a dos dias de hoje, passavam pelas portas das casas da aldeia do meu avô pessoas sem posses, sem casa, sem comida, sem o mínimo para sobreviverem. Trabalhavam nos campos, ora aqui, ora ali sem contratos. Afinal, o que era isso naquele tempo? E ainda mais na agricultura, sempre tão incerta nas suas produções. Hoje, apesar de tudo, consegue-se controlar muito mais e melhor a produtividade. A que custo?
Então, essas pessoas batiam às nossas portas e pediam comida. A abundância também não era muita em nenhuma ou na maioria das casas e, talvez por isso, a solidariedade, a compaixão e o apoio aos outros fosse mais natural e contínuo. Eram os pedintes. Que nome! Nem é bem o nome, é a condição.
Estes pedintes não tinham igualmente casas, nem sítio fixo para pernoitarem. Mas sabiam, por experiência, onde podiam bater, onde sabiam que seriam acolhidos de bom agrado e onde tinham um recanto aconchegado para passar a noite. Claro que não o faziam diária e seguidamente nas mesmas casas. Talvez por respeito e para não serem considerados abusadores, iam saltitando de abrigo em abrigo, de casa em casa.
Lembro-me que a casa dos meus avós tinha um local que se destinava a essas pessoas: a cama do pobre.
Era fora de casa, no varandão, um local onde costumavam guardar as colheitas, entre as quais a do milho. Era um sítio coberto onde um colchão muito velho e umas roupas e mantas ainda em pior estado serviam de agasalho ao pobre que, humildemente, pedira para lá dormir.
A manhã seguinte era sempre agasalhada com o pequeno-almoço em conjunto com a família. Depois partiam.
Era triste e foi marcante, pois decorridos tantos anos, de repente, sou invadida por estas memórias que nem sabia e que andavam perdidas em lugares recônditos da minha memória.
Porquê agora? Porque me lembrara eu agora daqueles dias? Talvez o início do tempo frio? Talvez esta pandemia que nos obriga a pensar e refletir….!
Sim. Lembrei-me que um dia, eu criança, me deitara, durante o dia, na cama do pobre. E gostei! Soube-me tão bem aquele aconchego, aquele quentinho, sem saber porque o achava tão interessante. Inocências de criança. Mas, a sensação ficou gravada.
Que outras memórias estarão guardadas! E onde? Será que vão dar sinal de vida? Vai depender dos estímulos.
Felizmente, hoje em dia não se vêm essas misérias. Vemos outras, outras desgraças, outras pobrezas!
Aguardemos por mais memórias!
5 de novembro de 2020
Helena Magalhães