Ana Sofia NOVEMBRO, 2015
Para o bem e para o mal, frequento o curso mais concorrido do país e um dos mais desejados do mundo, logo as notas de candidatura são, por norma, bastante altas e os requisitos apertados. Assim sendo, ao longo dos últimos anos, várias pessoas me perguntaram “qual era o meu segredo”. Como é evidente, não sou absolutamente nada fora do normal, nem tenho conhecimento de feitiços ou milagres nesta área. Neste artigo, vou apenas referir alguns hábitos que resultaram no meu relativo sucesso escolar, com o intuito de aconselhar os alunos curiosos que precisam de orientação para alcançarem os seus objectivos. No entanto, chamo a atenção para o facto de que o que resultou comigo não é lei universal. Para além disso, é muitíssimo importante entender que possuir uma média de 19 e tal não é sinónimo de inteligência ou genialidade. Devemos, acima de tudo, descobrir aquilo em que realmente somos brilhantes. E, se houve algo que aprendi na universidade até agora, é que não conseguimos ser excelentes em algo que não nos apaixona.
Posto isto, segue-se a minha abordagem ao estudo, embora esta seja actualmente um pouco diferente no ensino superior.
Optei por Ciências e Tecnologias, portanto só posso falar daquilo com que contactei. Contudo, existem alguns pontos transversais a qualquer disciplina e área.
Em primeiro lugar, nunca, mas mesmo nunca, desvalorizar a componente não cognitiva. Esta parte, independentemente da sua ponderação, avalia o que vocês são. Na vida, não se deve subestimar o poder do “charme”. Sê educado e responsável. Aposta seriamente na tua cultura geral, agora e sempre, e demonstra espírito crítico. Respeita todos os funcionários da escola. Espalha simpatia e prestabilidade, o que não quer dizer que se é “lambe-botas”. Os professores reparam nisso e não gostam, sendo completamente dispensável. Já a cortesia e a amabilidade ficam sempre bem, sem exageros para não causar desconforto, visto que cada pessoa tem um limite a partir do qual detecta bajuladores, o que devemos evitar. Permanece fiel ao que pensas, expõe os teus argumentos, sem jamais entrar em conflito com os teus superiores. Em suma, deves apostar fortemente no carisma. Acredita que em situações de dúvida, seja entre um 9 e um 10 ou um 19 e 20, estas pequenas coisas têm um peso enorme na balança.
Passando à componente cognitiva. Ora bem, parece ser do senso comum que um estudo diário e sistemático é o método mais correcto e eficaz. Admito que creio que a minha vida universitária seria mais fácil se me tivesse esforçado por adoptar esta técnica. Infelizmente, nunca consegui, quer pela minha rotina quotidiana, que envolvia actividades extra-curriculares consumidoras de bastante tempo, quer pela minha personalidade. Ainda que pertença à equipa da procrastinação, mantinha algumas regras:
1. Fazer sempre os trabalhos de casa, e mais um bocadinho.
Acho que nunca tive nenhuma falta de trabalho de casa. Para mim, foram uma tábua de salvação. Permitia rever as aulas e praticar. Não se queixem, vão sentir imensa falta deles. Também tentava fazer sempre mais do que aquilo que o professor mandava. Por exemplo, se o exercício 2 era o obrigatório, eu fazia o 1 também. Caso tivesse tempo, fazia logo todos os exercícios que existiam sobre aquele assunto, cadernos de exercícios ou de actividades incluídos. Não esquecer também o material da aula, revela responsabilidade e empenho.
2. Ter atenção e participar nas aulas.
Não sou a pura croma, que está sempre calada e bebe tudo o que o professor diz e faz, mas não abuso. Estar em silêncio não é estar atento. Às vezes, também desligava e sonhava acordada ou trocava umas palavras com os colegas e uns olhares com o telemóvel. No entanto, o importante é evitar ser apanhado. Repara que temos dois ouvidos e dois olhos por alguma razão. É um no professor, outro na turma. Gosto da imagem de ter as duas antenas ligadas, que se podem sintonizar diferentemente. Todavia, a prioridade é a aula, pelo que se deve acompanhar e compreender a matéria. Agiliza significativamente o estudo posterior, poupando tempo. Participar, respondendo às questões e fazendo perguntas, mostra que se está concentrado e a raciocinar sobre o que se está a dar. Esclarecer todas as dúvidas que surjam é essencial, sem medo de parecer ridículo como muitas vezes nos sentimos quando não percebemos ou sabemos algo. Cuidado com os comentários “espertinhos”, depende do contexto, do aluno que és e do professor da disciplina. A inteligência emocional é, de certa forma, também avaliada.
3. Estudar como se gosta.
Eu quando estudo algo, gosto de saber o motivo pelo qual devo estudar tal coisa. Para mim, é importante entender a realidade e a utilidade de determinado tema, estabelecendo pontes entre campos científicos, artísticos e sociais. Sinto que aprendo muito mais a ver filmes, a viajar e a visitar museus do que sentada numa secretária, mas não poder ser, não é?
Deve-se adoptar um método que funcione connosco. Eu tenho um pouco de todos os tipos de aprendiz, mas sou extremamente visual. Adoro uma boa imagem, um diagrama simples, um esquema bem feito. Normalmente, os livros têm alguns no final dos capítulos, que eu costumava copiar. Não sou grande fã de apontamentos, o que é curioso tendo em conta que amo escrever. Não consigo tirar muitos durante uma aula e demorava imenso tempo a fazer resumos, uma vez que, como o que queria era a pontuação perfeita, não cortava praticamente informação nenhuma, pois temia perder alguma coisa que pudesse precisar. Ainda assim, apontava algumas ideias-chave e escrevia principalmente conceitos que fossem indispensáveis memorizar. Os post-it são giros e dão jeito. Para além disso, gosto de um código de cores, tanto nas canetas como nos marcadores. Sublinhar é outro desafio com o mesmo problema dos resumos, no qual só agora começo a melhorar. Define uma hierarquia de cores e mantém-na.
Nota: Compra material de estudo bonito e mantém-no em bom estado. Descobri que trabalhar com coisas feias é um grande turn-off. Quando o livro recomendado da disciplina era menos apelativo, ficava imediatamente desmotivada.
4. Flexibilizar consoante a disciplina.
O estudo de Português não é igual ao de Matemática! Evita ter disciplinas favoritas para que não menosprezes nenhuma, mas distribui equitativamente o teu tempo e esforço. Se dominas inglês, não vais estar a estudar 6 horas para o teste quando ainda não entendeste como calcular a velocidade de uma esfera em queda livre ao chegar ao solo após ter sido lançada de uma altura de 7 metros. Eis o que para mim funcionou em cada disciplina que tive no secundário:
Matemática: podes ler a teoria, mas alimenta-te a exercícios. Faz todos o que conseguires arranjar. Pratica ao máximo, insistindo no que tiveres menos segurança e tira todas as dúvidas.
Português: muito importante pois pode influenciar o teu desempenho nas outras disciplinas, visto que todas recorrem minimamente às tuas capacidades linguísticas. Aqui, cada vertente avaliada têm a sua particularidade, mas obviamente hábitos de leitura e de escrita ajudam. Eu sempre me sentia um pouco perdida ao estudar português, por não saber como começar ou o que fazer. Estuda bem os conceitos fundamentais da disciplina e de cada capítulo abordado. Na gramática, entende a lógica, aprende truques e pratica bastante. Relativamente à interpretação, abre a mente e pensa. Escreve sempre as respostas da forma mais completa e correcta possível, recorrendo ao texto para as fundamentar, mesmo que estejas só a exercitar. Pede que te revejam as respostas e as composições, que também deves praticar antes do teste. Presta atenção à ortografia (por favor, por favor… É incrível a quantidade de erros ortográficos que se dão por dia neste país e a falta de correção linguística…) e prepara bem as apresentações orais atendendo aos critérios de avaliação.
Biologia e Geologia: compreende e estuda bem a teoria, recorrendo a esquemas para memorizares o que precisares. É uma disciplina algo complicada pelo formato dos testes/exame. Faz muitas escolhas múltiplas e pesquisa sobre os temas. Treina as respostas das perguntas abertas como se fossem ser avaliadas.
Física e Química: tal como a anterior, compreende e estuda bem a teoria, recorrendo a esquemas e diagramas para memorizares o que precisares e, de seguida, pratica imenso. Há muito a acontecer nesta disciplina, pois é necessário saber a teoria e colocá-la em prática, logo para além do português, possui uma forte componente matemática. Não acumules dúvidas.
Inglês: hoje em dia, o inglês é inegavelmente essencial. É mais importante saber falar inglês do que qualquer outra língua, portanto esta é de longe uma das disciplinas mais úteis que se pode ter. É extremamente fácil de estudar: ouvir música, ver filmes e séries sem legendas, ler… Como em todas as línguas, escutar, escrever e falar são os requisitos. Não esquecer a gramática, estudando as regras e fazendo exercícios. Existem sites online muito bons para treinar. Fala para ti próprio e com os outros em inglês. Eu até agora não frequentei nenhuma escola de línguas em que há um ensino muito mais especializado, o que não significa que é mais eficaz. A experiência diz-me que só vemos o que realmente sabemos quando não temos outra hipótese se não usar esta língua para que nos entendam.
Filosofia: uma das disciplinas mais bonitas e mais ignoradas. Este grande amor dos génios antigos devia ser muito mais acarinhado. Compreende a beleza das matérias, lê e interpreta-a à tua maneira. Procura memorizar algumas definições que possam ser úteis. No estudo e nos testes, constrói respostas completas recorrendo aos conceitos em questão, sabendo que a qualidade e correcção pesam imenso e faz toda a diferença. Simplesmente diz tudo o que conseguires sobre o assunto.
Educação física: pode parecer estúpido estar a dar conselhos sobre uma disciplina que normalmente toda a gente adora e que não exige muitas preocupações, mas esta era o meu calcanhar de Aquiles. Podes não ser dotado para os Jogos Olímpicos, mas usa os teus trunfos a teu favor. Esforça-te, mostra que sabes as regras e as técnicas, tem espírito de equipa e sê irrepreensível na componente não cognitiva, nomeadamente na higiene, pontualidade, responsabilidade e nos outros critérios, que deves conhecer bem.
Para os exames finais, organiza-te de modo a que consigas fazer tudo o que está ao teu alcance para estudar. Eu gostei bastante dos livros de preparação para exame da Porto Editora, os resumos da matéria estavam óptimos e tinham muitos exercícios e actividades, assim como testes e exames de exemplo e antigos, com soluções completas. Usei-os não só para as provas intermédias e finais, mas também para estudar para as avaliações da escola. O crucial é realizar todos os exames e testes intermédios de anos anteriores, para entender como são feitas as questões e familiarizar com o formato e critérios de correção.
Gere o stress. Sou a pessoa com menos moral para dizer isto, na medida em que o meu percurso foi marcado por choradeiras e ataques de pânico, absolutamente nada produtivos. Todos temos receio e medo, mas é necessário controlar a ansiedade, mesmo sendo quase impossível e eu ainda não descobri como. No entanto, penso que deve passar algures por relativizar. A vertente emocional também influencia o desempenho, pelo que existem alturas em que simplesmente não dá. Perdoa esses momentos menos bons, convalesce e regressa. Desistir não é opção.
Finalmente come e dorme bem. Esquece as noites em claro na véspera das avaliações. Nunca fiz nenhuma inteira, contudo, uma vez fiquei até às 5 da manhã de domingo e depois fui dormir até ao meio dia. Conclusão? Foi a minha pior nota nos exames nacionais a uma disciplina que adoro. Já na 2ª fase de Biologia e Geologia, em que já tinha perdido a esperança de aguentar o 19 com que tinha ido de nota interna, para além de não ter estudo nada, adormeci na manhã do dia do exame em cima do livro de preparação. Fui descontraída nessa tarde, professando a Lei de Murphy e tudo correu bem. As únicas diretas que deves fazer na vida são a dançar e não a estudar. Ainda tens, se os deuses forem bons, muitos anos pela frente que não vais querer passar com o cérebro em papa. Porém, a escolha é tua.
Tudo isto é muito bonito, mas sem motivação de nada serve. Define objectivos que realmente te façam feliz. O meu nunca foi entrar em Medicina, o que realmente queria era ser boa. O mais difícil não é lidar com as expectativas dos pais, professores ou colegas. No fundo, a pessoa que mais sofre com a desilusão somos nós próprios.
Que a força do conhecimento e da sabedoria estejam contigo.